domingo, 21 de junho de 2009

Perspectivas: o jovem e o mercado de trabalho no século 21

Tenho sido procurada para falar sobre as dificuldades que os jovens estão enfrentando para conseguir emprego. E também para opinar sobre o futuro dos jovens no mercado de trabalho.
E tenho recusado. Porque não estou acreditando – ainda - que a mídia estabelecida esteja interessada em avaliar essa questão do ponto de vista do ser humano que cada jovem é. E é essa a única perspectiva que me interessa examinar, olhar e escutar. Assim, escolho o blog para falar, escrever, sem cortes, sobre o que eu acredito.
Com isso, quero dizer que não importa qual sejam as condições oferecidas pelo mercado de trabalho, hoje ou ao longo do século 21, o jovem só terá chances de se dar bem, na profissão ou em qualquer outro setor da vida, se a sua formação de Ser Humano tiver sido estruturada a partir de um olhar e uma escuta integrativa. Um olhar e uma escuta treinados para o exercício da cidadania, da ética e, principalmente, do respeito à diversidade. A diversidade do ser.
O resto – o conhecimento teórico, prático, tecnológico de qualquer espécie – é muito mais fácil e rápido de adquirir para enfrentar o mercado de trabalho quando se tem “a mente aberta, a espinha ereta e o coração tranqüilo”, como já cantava Walter Franco, trinta anos atrás. E, então, não haverá empresa ou instituição no país ou no mundo que rejeite cidadãos plenos de ser, íntegros – ainda que lhes falte algum aprendizado técnico. Desde que seus talentos a serem desenvolvidos sejam conhecidos e reconhecidos como algo a ser trabalhado... tudo bem! Certamente haverá empregadores que dirão “Vamos lá! Vamos investir em quem cuida de Ser – mais do que Ter”.
Sabemos, sim, que está dificílimo entrar no mercado de trabalho. Sabemos, sim, culpar o sistema brasileiro de educação, o capitalismo selvagem, o empresariado, os banqueiros, a pobreza, a miséria, a violência, etc... Mas, difícil é nos vermos como parte da responsabilidade desse desvio.
Que tal começar, agora, a SER a mudança que você quer ver no mundo?

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Um caminho tem que ter coração

Esse diálogo entre Carlos Castañeda e D. Juan, na obra "A Erva do Diabo" foi muito importante nas minhas escolhas de vida.
Compartilho:


Segunda-feira, 28 de janeiro de 1963
- .... Há um meio especial de se evitar o sofrimento?
- Sim, há um Meio.
- É uma fórmula, um processo, ou o quê?
- É um modo de se agarrar as coisas. Por exemplo, quando eu estava aprendendo a respeito da erva-do-diabo, era por demais ansioso. Agarrava as coisas assim como as crianças agarram bala. A erva-do-diabo é apenas um entre um milhão de caminhos. Tudo é um entre um milhão de caminhos (un camino entre cantidades de caminos). Portanto, você deve sempre manter em mente que um caminho não é mais do que um caminho; se achar que não deve segui-lo, não deve permanecer nele, sob nenhuma circunstância. Para ter uma clareza dessas, é preciso levar uma vida disciplinada. Só então você saberá que qualquer caminho não passa de um caminho, e não há afronta, para si nem para os outros, em largá-lo se é isso o que seu coração lhe manda fazer. Mas sua decisão de continuar no caminho ou largá-lo deve ser isenta de medo e de ambição. Eu lhe aviso. Olhe bem para cada caminho, e com propósito. Experimente-o tantas vezes quanto achar necessário. Depois, pergunte-se, e só a si, uma coisa. Essa pergunta é uma que só os muito velhos fazem. Meu benfeitor certa vez me contou a respeito, quando eu era jovem, e meu sangue era forte demais para poder entendê-la. Agora eu a entendo. Dir-lhe-ei qual é: esse caminho tem coração? Todos os caminhos são os mesmos: não conduzem a lugar algum. São caminhos que atravessam o mato, ou que entram no mato. Em minha vida posso dizer que já passei por caminhos compridos, mas não estou em lugar algum. A pergunta de meu benfeitor agora tem um significado. Esse caminho tem um coração? Se tiver, o caminho é bom; se não tiver, não presta. Ambos os caminhos não conduzem a parte alguma; mas um tem coração e o outro não. Um torna a viagem alegre; enquanto você o seguir, será um com ele. O outro o fará maldizer sua vida. Um o torna forte; o outro o enfraquece.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Convite ao encontro

J.L.Moreno, criador do Psicodrama

“Um encontro entre dois:
olho no olho, cara a cara.
E quando estiveres próximo,
tomarei teus olhos e os colocareis no lugar dos meus,
e tu tomarás meus olhos e os colocarás no lugar dos teus,
então, eu te olharei com teus olhos
e tu me olharás com os meus.
Assim nosso silencio se serve até das coisas mais comuns
e o nosso encontro é meta livre:
o lugar indeterminado, em um momento indefinido,
a palavra ilimitada para o homem não cerceado”

terça-feira, 14 de abril de 2009

O Corpo e seus símbolos

Jean-Yves leloup - Editora Vozes, 1998

O perdão, quando bem compreendido, é um instrumento de cura. Freqüentemente ficamos doentes porque não perdoamos e o rancor e a cólera nos corroem o fígado e os rins. A questão é como manter juntos o perdão e a justiça, (...) o olho da verdade e o olho da misericórdia.
Creio que não devemos perdoar muito rápido. É necessário, antes de perdoarmos, que expressemos o sofrimento pelo que nos foi feito e a isso chamo justiça. O sinal-da-cruz, tal como era feito nos doze primeiros séculos de nossa era, expressava bem esse sentimento. Começava-se por uma linha vertical, da testa ao peito, em seguida levava-se a mão ao ombro direito e depois ao esquerdo (atualmente faz-se o contrário), simbolizando a passagem da justiça para a misericórdia. Começando sempre pela justiça, exigindo que fosse reconhecido o mal que foi feito, o inaceitável de certas situações e de certas violências. Portanto, o pedido de justiça é essencial. Mas é essencial, também, ir além da justiça, em direção à misericórdia, em direção ao perdão, em direção ao lado que é o lado do coração.
O que é o perdão? O perdão é não aprisionar o outro nas conseqüências negativas de seus atos. É não nos aprisionarmos ou aprisionarmos o outro no carma. O perdão é a própria condição para que nossa vida continue a ser vivível. Se não perdoarmos uns aos outros, a vida vai se tornar impossível de ser vivida.
(...) Como fazer para que este perdão se torne algo verdadeiro? Platão dizia: “Aquele que tudo compreende, tudo perdoa”. Aquele que se conhece a si mesmo, com suas ambigüidades, pode compreender o outro em suas sombras. Portanto, inicialmente, o perdão pode ser uma questão de inteligência, de compreensão. Perdoar você significa que eu o compreendo, mas não quer dizer que (...) o que você fez é bom. Compreendo que você é um ser humano, que é capaz de me enganar como eu próprio faria se, provavelmente, estivesse nas mesmas condições.
A atitude de Cristo aos que queriam lapidar a mulher adúltera é: “Aquele que estiver sem pecado atire a primeira pedra”. Lembrem-se como aos poucos todos se retiram, do mais velho ao mais jovem. Nesse caso Jesus se serve da Sagrada Escritura, não para mostrar aos outros como eles são pecadores, mas para fazê-la de espelho onde eles podem ver suas fraquezas, suas falhas e compreender as dos outros, não os aprisionando nas conseqüências negativas de seus atos.
Além de perdoar com a cabeça é preciso perdoar com o coração e, vocês sabem, o corpo é o último que perdoa. Se alguém lhes fez mal, se lhes causou sofrimento, vocês podem tê-lo perdoado com a “cabeça”, tê-lo compreendido com o coração, pensar que o passado passou. Entretanto, quando essa pessoa se aproxima, seu corpo se crispa e se enrijece mostrando bem que ele ainda não perdoou, que muitas memórias estão ainda bem guardadas.
Creio que é verdadeiramente uma graça quando nos encontramos perto de alguém que nos tenha feito mal e sentimos nosso corpo calmo, nosso coração límpido. Podemos dizer que, verdadeiramente, estamos curados. Por isso, creio que o perdão é uma prática de cura.
No Pai-nosso se diz: Perdoai-nos do mesmo modo como perdoamos. Como se o dom da vida só pudesse circular em nós dependendo de nossa capacidade de perdão. Se não perdoamos ficamos prisioneiros, bloqueados em uma situação, em um rancor, e a vida não pode circular.
Perdoar não é fácil...
Quando eu era jovem padre e morava no interior da França, todos os domingos levava uma senhora paralítica à missa. Ela era portadora de esclerose em placas. Um dia contou-me do ódio que nutria pela mãe porque a tinha impedido de casar-se com o homem que amava, e, apesar disso, passara a vida inteira cuidando da mãe, ocupando-se dela. Apesar de exteriormente comportar-se como uma mulher respeitável e admirável, dizia-me que em seu interior só havia raiva. A dureza de seu coração impregnara seu corpo, transformando-o em corpo rígido e paralisado. Assim, as doenças psicossomáticas têm, às vezes, uma origem espiritual.
Disse a esta senhora: “Já que você é cristã pode perdoar sua mãe”. Tornou-se encolerizada e, com uma raiva muito densa e muito íntima, respondeu-me: “Não, não, jamais a perdoarei. Minha mãe impediu-me de viver, o que sinto por ela é um veneno que levarei ao túmulo”. Neste momento compreendi o meu erro e lhe disse: “Você tem razão. O que você viveu é imperdoável. Você não pode perdoar quem a impediu de viver. Mas pense, creia, o Cristo que existe em você pode perdoá-la”. Atualmente eu lhe diria: “O ego não pode perdoar: Não se deve tentar perdoar com o ego. Entretanto, talvez o self possa perdoar. Talvez haja dentro de nós uma dimensão maior que nós mesmos, que pode compreender e perdoar”. Passaram-se cinco longos minutos. Em dado momento vi uma lágrima correr pela face daquela senhora. Ela chorou, chorou muito. Levantou-se da cadeira de rodas e saiu andando de seu quarto. Há mais de quarenta anos não chorava, há mais de dez anos não andava. Esse é o milagre do perdão.
Muitas vezes, está acima de nossas forças perdoarmos a partir de nosso pequeno ego. Se disséssemos “eu te perdoo”, seríamos hipócritas, pois nosso corpo e nosso coração não conseguem perdoar. Porém, podemos abrir-nos a uma dimensão mais vasta que nós mesmos e então o perdão pode chegar.
O perdão não é humano, é um ato divino. Quando Jesus perdoa, seja a mulher adúltera, seja Míriam de Magdala, seja um “colaborador” como Zaqueu, os fariseus que o cercam se perguntam: “Quem é este homem que perdoa? Pois só Deus pode perdoar”.
Assim, é preciso lembrar que, cada vez que perdoamos depois de termos pedido justiça, acordamos para uma dimensão divina de nós mesmos. O perdão é um exercício de divinização onde o humano se torna divino. Continuando humano, temos que reclamar justiça e, quando for possível, dizer o que foi mau ou destrutivo para nós e pedir uma reparação. Também somos capazes de misericórdia e de perdão. Portanto, é preciso que mantenhamos juntas a justiça e a misericórdia. São dois olhos, às vezes, estrábicos. Podemos esquecer a justiça e nosso perdão ser superficial, podemos esquecer o perdão e partimos para uma justiça inquisitorial.
Uma centelha

Jean-Yves Leloup

Todo incêndio
Começa com uma fagulha,
uma fagulha incandescente
que irradia seu calor, sua luz...
Uma centelha de luz
que nos desperta ou nos destrói
……
Vele pelos teus pensamentos
Eles iluminam,
mas eles também podem turvar o mundo
……
Toda manhã busque a centelha,
a fagulha, o lampejo que faz arder em ti o dia…
Não nascemos apenas para ver as coisas
mas para ver o dia onde nos aparecem as coisas...
muitos morrem sem jamais terem “visto o dia”

Espiritualidade


Roberto Crema

Quando eu falo em espiritualidade, não estou me referindo a nenhuma igreja, a nenhuma religião particular, embora respeite todas. Refiro-me à espiritualidade como o fazia Einstein, apontando para uma vivência cósmica; ou, ainda, outro físico contemporâneo, Fritjof Capra, que denominou seu penúltimo livro de Pertencendo ao Universo.
Espiritualidade é uma consciência não-dual, uma consciência de participação, da parte no todo, que na essência é o amor, e na prática é solidariedade. Uma pessoa que despertou para essa dimensão espiritual é uma pessoa que não se vê separada do outro, da comunidade e do Universo. Eu pergunto: em sã consciência, você colocaria fogo no seu corpo? Se você sente-se não-separado do outro, você jogaria fogo em alguém que está dormindo num banco? E se você se sente não-separado da natureza, você iria empestá-la, destruir ecossistemas por uma neurose de progresso compulsivo, que foi decantada no século passado por Comte e que, agora, testemunhamos o lado sombrio dessa religião do progresso a qualquer custo, progresso a custa da hecatombe? Você empestaria a natureza se você se sentisse não-separado dela?
O investimento maciço na alma é a única estratégia que poderá viabilizar a perpetuação, com qualidade e dignidade de nossa espécie. Antigas e esquecidas lições: para que serve ganhar o mundo inteiro se você perdeu a sua alma, se você se perdeu de si mesmo, se você se esqueceu do ser que lhe faz ser? Felizmente, crise é também oportunidade de aprender e de evoluir. Gosto de confiar que o ser humano será a maior descoberta do terceiro milênio!

EU NÃO SOU EU

EU NÃO SOU EU

Juan Ramón Jiménez

Eu não sou eu.
Sou este que vai ao meu lado sem eu vê-lo;
que, por vezes, vou ver,
e que, às vezes, esqueço.
O que se cala, sereno, quando falo,
o que perdoa, doce, quando odeio,
o que passeia por onde estou ausente,
o que ficará de pé quando eu morrer.